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Modificação da Legislação Trabalhista

03/03/2008

Flexibilização - Indenização em Resilição com Justa Causa - Convenção 158 da OIT à Luz do Ordenamento Jurídico Interno Brasileiro
No seio da sociedade em que vivemos, transformações de toda ordem acontecem em velocidade cada vez maior e as relações sociais vão se tornando mais complexas e atribuladas, exigindo novas posturas para fazer frente aos desafios contemporâneos.
Por Melise Cezimbra Mello e Rodrigo Duarte da Silva

Neste contexto de incertezas e conflitos, um dos maiores desafios que se colocam frente aos operadores do direito e profissionais de R.H. é a harmonização entre CAPITAL X TRABALHO.

Numa sociedade auto-intitulada democrática, tudo goza de substrato político. O país vive a efervescência, fruto do naufrágio de várias tentativas de reformar a Constituição em sua parte estruturante. mais um mandato presidencial, viciado, ineficiente e ineficaz. Vivemos sob o jugo de uma Carta de Retalhos Constitucionais. As ruas não estarão clamando, marginalmente, pelo retorno do Poder Constituinte Originário?

Nosso ordenamento não permite a implantação de modelos eficazes de gestão. Demandamos reformas urgentes. Reforma política, educacional, tributária, trabalhista e previdenciária. Para isso precisamos de propostas técnicas e práticas. Demonstra-se premente a flexibilização das relações entre capital e trabalho. Esta discussão se estende por séculos, motivando guerras e revoluções. Creio que o Brasil pode contribuir ao debate, valendo-se do principal traço de nosso caráter médio: a tolerância.

O objeto deste discurso perpassa o alcance das normas esculpidas no § 4º do artigo 60, como cerne imodificável da atual Constituição, com ênfase nos limites do poder constituinte reformador frente aos direitos fundamentais sociais. O texto buscará definir em que termos devem ser concebidos como inalteráveis as normas previstas no artigo 60, §4º, da Constituição de 1988, e qual o limite desta imutabilidade, pontuando o cenário com a discussão em torno da flexibilização dos direitos previstos no art. 7º da Carta. Se por um lado devem ser preservados aqueles valores tomados pelo constituinte originário, em representação à vontade da comunidade, por outro, deve-se evitar o emprego desvirtuado e vulgarizado das cláusulas de inamovibilidade, sob pena de instaurar-se o engessamento da ordem fundamental diante das alterações dos fatos econômico-sociais.

Apesar de ratificada, a Convenção 158 foi denunciada pelo Brasil em 20 de dezembro de 1996, sob a alegação de que há inconstitucionalidade formal. Pela leitura do artigo 4, a matéria objeto da Convenção 158 é a mesma do inciso I, do artigo 7º da Constituição Federal, com a utilização de outras palavras, em conformidade coma transcrição de ambos os dispositivos para efeito de comparação a seguir:

“Artigo 4º - Não se porá fim à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para ele uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço. (Convenção 158) “

“Artigo 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.”

A inconstitucionalidade formal da Convenção 158 reside no fato de que a matéria disposta no inciso I do artigo 7º da Constituição Federal deva ser regulamentada por lei complementar.

Embora numa primeira abordagem possa parecer que a Convenção 158 haveria de prevalecer em nosso ordenamento jurídico, em face da conclusão dos procedimentos solenes da ratificação e promulgação, sobrepondo-se sobre todos os preceitos da nossa legislação relativos à despedida de empregados, o exame mais apurado do assunto revela, todavia, que isso não se dá. A matéria nela versada depende de disciplina através Lei Complementar, como se infere claramente das disposições contidas no artigo 7º, inciso I, da vigente Carta Magna, norma, iniludivelmente, hierarquicamente superior aos decretos legislativos e do executivo, do que decorre que a aprovação da Convenção 158 da OIT, pelo Congresso Nacional, é inconstitucional.

Em contrapartida, existem alguns doutrinadores que acreditam ser a Convenção 158 constitucionalmente formal como Amauri Mascaro do Nascimento, Barros Jr. e José Alberto Couto Maciel. Para Nascimento, segundo o princípio de que a lei posterior revoga a anterior, a Convenção 158 teria revogado o disposto no inciso I do artigo 7º da Constituição Federal. Já segundo Maciel, a lei complementar somente regularia a indenização compensatória, não a garantia ao emprego. Mas esses argumentos não procedem, posto que somente seria válido se não houvesse a ressalva de que toda a matéria contida naquele dispositivo deve ser regulamentada por lei complementar. E por ser equivalente à lei ordinária, a convenção incorporada ao ordenamento jurídico interno não pode modificar norma constitucional.

Assim sendo, sem adentrar ao mérito da constitucionalidade ou não das regras ali impostas e do alcance das obrigações das empresas, parece claro que a citada Convenção 158 da O.I.T ainda poderá trazer polêmica às relações de trabalho, merecendo uma atenção especial por parte dos profissionais de R.H. quanto aos desdobramentos que a eventual volta dos efeitos desta norma trará para as relações trabalhistas.

Se o posicionamento de nossos Tribunais for pela validade da norma, com certeza, teremos uma nova discussão acerca das condições ali impostas para a dispensa do trabalhador, trazendo novas responsabilidades para todos os lados envolvidos (empresas, empregados, sindicatos e legisladores). O objetivo subsume-se em dar a real proteção que a Convenção estabelece, sem tornar tal dispositivo mais um encargo a ser suportado pelas empresas, e que, ao invés de cumprir com seus objetivos legais (se subentende que o espírito da lei é a proteção o emprego), acabe por se tornar em mais um incentivo à informalidade e ao desemprego.

É inegável que a Constituição de 1988 promoveu avanços significativos na consolidação dos direitos sociais. Os passos dados representam conquistas que se faziam necessárias nos campos da família, da saúde, da educação, da participação política, do meio ambiente e do consumo. Minimizou-se desigualdades, beneficiando segmentos historicamente desrespeitados (mulheres, idosos etc), contribuindo para lançar as bases de uma sociedade mais justa e democrática. Os direitos humanos vêm sendo definidos e organizados. Ao observar o princípio da dignidade da pessoa humana, o Estado atende ao seu fim precípuo, o homem, defendendo a liberdade como primado básico, incorporada à órgãos institucionais de fomento. A idéia de um Estado Mediador não omisso deve orientar a política governamental pátria, concretizando um ferramental formatador de um novo contrato social. Desponta a flexibilização das relações de trabalho como fator de aglutinação, edificador de um ambiente jurídico–econômico de ponta. Trata-se de um problema de prioridade política associada à opção por executar políticas e ações capazes de aliar estabilidade à crescimento com inclusão social.

Consideramos que uma nova postura sindical, associada a um posicionamento claro por parte do Estado, abrirá precioso espaço à flexibilização das normas trabalhistas, medida que urge ser aplicada ao Direito Laboral Brasileiro. Na atual situação do país, é impossível prever uma ampla desregulamentação das relações de trabalho. A negociação individual entre empregador e empregado denota-se impossível, posto que a desproporcionalidade de forças é notória. O trabalhador sempre sairá prejudicado. Neste sentido, acreditamos que a negociação sindical associada à atuação sindical amplificada deve ser privilegiada. O rompimento com a regulação exclusivamente legal é possível, desde que um novo sistema de proteção negocial, nascido de sólidas unidades sindicais, venha a ser constitucionalmente implementado.

No âmbito da negociação, assume lugar de destaque o princípio da proporcionalidade, ferramenta de parâmetro indispensável no processo de ponderação de bens e direitos em jogo. O princípio da proporcionalidade, de origem alemã, é ativo, fixa limites, estabelece formas em que os meios e o fim são proporcionais. Creio que no seio da prática negocial poder-se-á evitar a supressão definitiva de diversos direitos sociais de nosso ordenamento.

Vivemos ou não uma crise de representação em nosso Estado de Direito? As leis realmente garantem e concretizam os direitos sociais fundamentais arrolados na Constituição da República? A eficácia (jurídica e social) dos direitos sociais fundamentais deve ser objeto de permanente maximização a partir da luta pela sua concretização, dissídio após dissídio, consideradas as demandas das partes envoltas, Estado, Empresa e Trabalhadores. Respeitados os princípios, direitos e garantias previstos na Constituição, ganha a eqüidade, ganha a sociedade, ganha o Mercado, ganha a dignidade da pessoa humana.

O trabalhador brasileiro que busque vanguarda. As relações de trabalho devem se materializar preponderantemente no ambiente privado, sindical, autônomo. Não devemos permanecer contaminados pelo intervencionismo obtuso, gerador de desemprego e instabilidade. Flexibilizar direitos sociais fulcrado no direito de escolha e negociação sindical denota eternizar conquistas históricas dos trabalhadores, adequando-as às modernas demandas do mercado de trabalho.

A luta de classes é inexorável. A luta por postos de trabalho, não. Se necessário for, clamemos pelo retorno do Poder Constituinte Originário...

Rodrigo Duarte da Silva
OAB/SC 11.079 (17.324

Melise Cezimbra Mello
OAB/RS 54.042

03/03/2008

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